O real valor dos nossos dados, por Rafael de Albuquerque*
Você está navegando tranquilamente na internet, em seu site de notícias favorito, quando se depara com um anúncio de um pacote turístico imperdível, justamente para o mesmo destino que está pensando para as próximas férias com sua família. Mera coincidência? Ao passear no shopping após o almoço com colegas de trabalho você observa na vitrine de uma loja de artigos esportivos a nova camisa do seu time de coração e, antes de chegar ao escritório, já recebe uma mensagem em seu celular com a mesma camisa em promoção. Obra do acaso? Esses exemplos corriqueiros mostram que a inteligência artificial vem transformando nossos dados em informação relevante para as empresas.
Na era da transformação tecnológica em que permanecemos conectados 24 horas por dia e sete dias por semana, essa realidade está cada vez mais presente e preservar nossos dados só seria possível se estivéssemos isolados do mundo em um local muito distante da civilização. Como essa tarefa se torna praticamente impossível, estamos ganhamos um forte aliado na proteção das informações que geramos com a criação da Lei Geral de Proteção de Dados, inspirada na lei europeia General Data Protection Regulation (GDPR).
A lei, que ainda está em tramitação e deverá entrar em vigor em agosto de 2020, irá regulamentar e impor limites quanto ao uso de informações pessoais por parte de empresas e governos, evitando violações externas ou o uso indevido de seus dados. A nova norma ainda irá passar por diversas discussões no Congresso e, uma vez aprovada, permitirá ao país ter uma legislação específica para proteger as informações de seus cidadãos. Está prevista uma série de regras que as empresas e outras organizações que atuam no país terão de seguir para permitir que o indivíduo tenha mais controle sobre o tratamento que é dado a suas informações pessoais. As corporações que desrespeitarem essas regras estarão sujeitas a punições severas.
A existência de uma legislação com tal propósito fará com que as pessoas passem a ser mais criteriosas na hora de repassar seus dados privados, seja em uma postagem na rede social ou no fornecimento de documentos como RG e CPF para determinadas companhias. O conhecimento do destino dos dados e também a forma como eles serão utilizados darão segurança jurídica às pessoas.
E quais são os tipos de dados? Temos os públicos, disponibilizados pela própria pessoa quando anuncia a venda de algum bem e passa suas informações para os contatos; os privados, quando você efetua uma compra pela internet e disponibiliza as informações para confirmação da transação eletrônica; e os sensíveis, com informações sigilosas do cidadão.
As empresas que se adaptarem e obedecerem a lei irão se diferenciar das demais e serão valorizadas no mercado com potencial para possibilitar novos negócios e realizar transações e parcerias com as empresas europeias que já estejam em conformidade com a legislação daquele continente.
Benefícios e facilidades
A inteligência artificial faz com que esse tipo de dado seja bastante disputado e valorizado, além de ser utilizado para facilitar nossa vida e promover uma nova maneira de pensar sobre problemas e desafios. Nesse sentido, os avanços não param.
O aplicativo de transporte, por exemplo, conhece nossos hábitos e os caminhos que costumamos percorrer do trabalho até nossa casa. O serviço de streaming sabe que o casal adora séries de suspense durante a semana e aos sábados e domingos opta por uma comédia romântica. A rede social com foco no mercado de trabalho nos indica as empresas com o perfil que buscamos e nossas áreas de interesse. Até mesmo os aplicativos de relacionamento conhecem nossos gostos e preferências e, assim, nos ajudam a encontrar a tão sonhada “alma gêmea”.
Podemos ter uma noção maior dessa influência em espaços com grande circulação de pessoas, como aeroportos, rodoviárias, shopping centers, academias, hotéis, restaurantes e lanchonetes. É possível monitorar cada passo da pessoa e os estabelecimentos comerciais poderão ofertar promoções customizadas com base em seus hábitos de consumo, detectando o caminho percorrido, em que loja entrou, se esteve no cinema ou parou na praça de alimentação, etc. Está aí a resposta para quando você efetuar uma compra e receber a mensagem perguntando como foi sua experiência em determinada loja.
Vale notar que a geração de dados vai aumentar consideravelmente nos próximos anos, possibilitando avanços ainda mais relevantes, principalmente na área da saúde. Grandes players globais vêm estudando e desenvolvendo tecnologias para o prolongamento da vida humana. Imagine que uma pessoa tenha um pequeno sensor que emite informações plugado em seu coração ou em qualquer outra parte do corpo. Os dados vão monitorar o funcionamento de todos os seus órgãos, gerando uma infinidade de informações que poderão antecipar doenças ou qualquer anomalia no organismo, ajudando a identificar antecipadamente doenças ou enfermidades que poderão ser prevenidas, por exemplo, com a substituição de um órgão. São os dados prolongando a nossa vida.
Com tantos pontos positivos, nossos dados serão cada vez mais disputados e valorizados pelas empresas. Quando, no passado, assistíamos ao desenho futurista Os Jetsons, que previa o futuro no qual haveria carros voadores e iríamos conviver com robôs em nossas casas, jamais poderíamos imaginar que teríamos informações tão valiosas. Estamos chegando à era em que nossos dados vão valer tanto quanto nosso dinheiro. Ou mais.
* Rafael de Albuquerque é fundador e CEO da Zoox Smart Data