Experiência emocional: neuroarquitetura aplicada em vitrines atrai clientes e estimula compras
Arquiteto e urbanista, Lorí Crízel explica como essa ciência pode influenciar no interesse pelos produtos e nas decisões dos consumidores
Em um universo de alta concorrência, no qual o uso do marketing de forma eficiente é essencial, um velho elemento faz a diferença na decisão do cliente: a vitrine. E a neuroarquitetura, ciência que analisa os impactos do ambiente físico no comportamento humano, tem sido cada vez mais utilizada nos projetos de grandes grifes, promovendo uma “experiência emocional” e influenciando na tomada de decisões dos consumidores.
“Com o advento das redes sociais, nesta época em que são cada vez menores os períodos que temos para a realização das atividades, estamos vivendo em um cenário de processamento informacional com um tempo muito reduzido. O impacto visual deve acontecer em menos de dois segundos para o consumidor. Assim, a gente começa a entender que a vitrine, seja por meio de uma promoção, das cores dos elementos ou dos materiais usados, é o convite e a primeira parte da comunicação para trazer as pessoas para dentro da loja”, ressalta o arquiteto e urbanista Lorí Crízel (foto), especialista em neuroarquitetura.
Presidente da ANFA (Academy of Neuroscience for Architecture) no Brasil e autor do primeiro livro do país sobre neurociência aplicada à arquitetura, design e iluminação, o especialista lembra que, há cerca de duas décadas, começou a ser trabalhado um conceito no retail design (design de varejo) chamado Design Emocional. Trata-se de uma prática adotada no varejo para promover uma organização espacial, comunicativa e experiencial, com a meta de impulsionar as vendas de bens e serviços ao consumidor. “O design emocional utiliza aspectos de determinados elementos para despertar sensações no público-alvo, que foi estudado e é impactado por este conceito trabalhado dentro do mundo físico”, diz.
Como exemplo, ele cita a compra de um dado produto por um consumidor. “A junção de várias características físicas deste produto fará com que o consumidor escolha por um modelo específico. Essa decisão não está apenas ligada ao preço, mas também ao conceito emocional dessa experiência”, explica Crízel.
O especialista ressalta que o marketing, diante de uma avalanche de informações, começou a valorizar o significado da experiência de a pessoa procurar um produto em uma loja física, que é bem diferente do que ocorre quando o consumidor opta por adquiri-lo na internet e está sujeito a se decepcionar quando o recebe. “Pessoalmente, a visita ao local pode oferecer uma grande carga emocional. E, hoje, tirou-se da mente aquela ideia de cliente fidelizado, mas, sim, a do cliente satisfeito nesta relação entre as partes. Pois, a partir do momento em que você se sentir insatisfeito, vai parar de consumir um determinado produto. Enquanto estiver satisfeito, você continuará tendo uma relação com aquela marca”, explica.
A era do “phygital” e da estética funcional
Muito mais do que apenas expor os produtos, as vitrines das lojas podem ficar em evidência por meio de recursos tecnológicos, que proporcionam uma interação completa com os consumidores. Crízel explica que vivemos a era do “phygital”, ou seja, a união dos universos físico e digital em uma única experiência aos clientes, que passam a desfrutar de um processo de compra mais atrativo e personalizado para atender às suas preferências. Como exemplo, ele cita vitrines com recursos que filmam o cliente, espelham a sua imagem em uma tela e permitem que o consumidor, mesmo fora da loja, possa simular de forma virtual a ação de experimentar uma roupa.
“No vitrinismo, começa a ser usado esse mesmo nível experiencial, com lojas que são expositoras de uma experiência e trabalham com uma interação com o público. Estamos na era do ‘phygital’, e uma das características deste conceito é a valoração que se dá a uma relação interativa. E quem trabalha com vitrinismo tenta traduzir, a partir da vitrine, os valores de uma marca ao consumidor. Nesta interação, existe a busca por gerar uma ‘relação dopaminérgica’, na qual busca-se promover uma sensação de satisfação, de retorno, de recompensa”, explica o arquiteto.
A opinião é compartilhada pelo vitrinista Leonardo D’Avila, brasileiro que atualmente trabalha na área comercial da Givenchy, grife de produtos de luxo e joias, em Miami, nos Estados Unidos, onde também já prestou serviço para a Giorgio Armani, outra gigante deste setor da economia. “A vitrine, muito mais do que vender uma roupa específica, quer passar uma sensação para quem está a vendo. E é essa sensação que vai fazer a pessoa decidir entre entrar na loja ou não. Isso é, com certeza, muito mais evidente nos dias de hoje, após a criação do omnichannel (estratégia que visa centralizar os canais de comunicação de uma empresa para vender produtos), com a possibilidade de o cliente comprar on-line e ter mercadoria entregue na sua casa”, destaca.
“A loja física, além de ser superimportante para quem prefere consumir dentro dela, tem de conseguir uma conexão entre a marca e o cliente, que precisa ter um sentimento não só por meio da vitrine, mas pelo ambiente todo. É por isso que o visual merchandising (prática que valoriza produtos, marcas e o ponto de venda para atrair e estimular compradores) tem causado essas sensações de olfato, visão, tato etc. É a construção de um ambiente”, reforça D’Avila.
Em meio a esse panorama, Crízel lembra que as vitrines projetadas com as ferramentas da neuroarquitetura ajudam uma empresa a vender mais também para um perfil de cliente conhecido no mercado como shopper, que realiza a compra, mas não é um consumidor final daquele determinado produto. “A pessoa, muitas vezes, busca algo que não é para si própria e faz parte de um universo que ela não conhece. E a boa vitrine identifica muito nitidamente como aquela marca conversa com o público-alvo que pretende atingir. Assim, mesmo enquanto shopper, um comprador consegue perceber características que estão ligadas às preferências da pessoa para a qual está adquirindo um produto”, diz.
Tipologias de cor e de iluminação, a diagramação das proporcionalidades do espaço exposto através da vitrine, além de questões como a cultura e a geografia de um lugar, são citadas por Crízel como fatores que influenciam os conceitos da neuroarquitetura e que serão aplicados em um projeto. E ele destaca que a procura por esse tipo de ferramenta da neurociência é crescente neste setor da economia. “O aumento dessa demanda é significativo no varejo, pois, hoje, se entendeu que não adianta ser só bonito, é preciso ter uma estética funcional para atender ao propósito daquele projeto. Em alguns casos, uma loja é simples, mas exerce uma atração ao seu público-alvo, e é melhor que seja simples”, finaliza.
Ao comentar essa realidade, D’Avila enfatiza que diversas campanhas de marketing, como as criadas para datas como o Dia dos Namorados e o Dia das Mães, hoje, são muito direcionadas para as pessoas que consumirão um produto como compradoras, e não em quem será presenteado. “Normalmente, são voltadas para causar uma sensação, por exemplo, no filho que se sentirá próximo da mãe de alguma maneira. Sempre as campanhas mostram alguma coisa relacionada ao amor, como o que é sentido em relação ao seus pais. Então, a vitrine é como uma comunicadora, que vai tentar capturar o sentimento dessa pessoa, que é a consumidora, e não o da mãe, que ganhará o presente”, explica.